segunda-feira, 21 de março de 2016

Complexo vira lata do brasileiro

           Causou certa indignação em determinados setores da sociedade brasileira a construção do Porto de Mariel em Cuba financiado pelo BNDES. Na época de sua inauguração eu afirmei que essa corrente da sociedade brasileira estava equivocada por acreditar que o investimento se tratava de uma aliança ideológica entre os governos petistas e a família Castro, responsável pela ditadura na ilha. Na verdade, o empréstimo concedido a Cuba trata-se de um ato pragmático e amplia o alcance do comércio e a área de influência do Brasil.
            O porto de Mariel é uma obra colossal e considerado tão sofisticado quanto os maiores terminais do Caribe - os de Kingston (Jamaica) e de Freeport (Bahamas), e terá capacidade para receber navios de carga do tipo Post-Panamax, que vão transitar pelo Canal do Panamá após finalização da sua modernização.
            O porto de Mariel foi erguido pela Odebrecht em parceria com a cubana Quality, custou 957 milhões de dólares, sendo 682 milhões de dólares financiados pelo BNDES. Em contrapartida, 802 milhões de dólares investidos na obra foram gastos no Brasil. Portanto, a obra se pagou na compra de bens e serviços comprovadamente brasileiros. Pelos cálculos da Odebrecht, este valor gerou 156 mil empregos diretos, indiretos e induzidos no nosso país.
            Mas existem aspectos importantes a serem analisados nessa parceria entre o Brasil e Cuba. Nesse caso, nosso país se consolida como  “parceiro econômico de primeira ordem” de Cuba. As exportações brasileiras para a ilha quadruplicaram na última década, chegando a 450 milhões de dólares, alçando o Brasil ao terceiro lugar na lista de parceiros da ilha (atrás de Venezuela e China). A tendência é de alta se a população de Cuba (de 11 milhões de pessoas), hoje alijada da economia internacional, for considerada um mercado em potencial para empresas brasileiras.
            Como afirmou no passado o subsecretário-geral da América do Sul do Ministério das Relações Exteriores, embaixador Antonio José Ferreira Simões: “Esse mercado só será efetivado, entretanto, se a economia cubana deixar de funcionar em seu modo rudimentar atual”. Portanto, a visita do presidente Barak Obama a Ilha de Cuba e a reaproximação dos EUA com Cuba, significa dizer que  o modelo econômico cubano passará por uma “formatação”.
            Desse modo, quando o Brasil investiu no porto de Mariel, verificou-se o potencial de buscar mercado para as empresas brasileiras. Não é à toa, portanto, que o Brasil abriu uma nova linha de crédito, de 290 milhões de dólares, para a implantação desta Zona Especial em Mariel. Outro aspecto importante é a localização de Mariel. O porto está a menos de 150 quilômetros do maior mercado do mundo, o dos Estados Unidos.
            O fim do embargo comercial dos EUA a Cuba, se torna estratégico para as companhias brasileiras por conta de sua posição geográfica. Além disso, a população cubana consistirá em mão de obra barata para as empresas ali instaladas. Daí, fica completo o potencial comercial de Mariel aos olhos dos modus operandi do capitalismo.
            Diante do exposto, o complexo vira lata por muito tempo perdurará em parte da sociedade brasileira, ou seja, por não conseguir compreender esse tipo de ação estratégica comercial do Brasil com países de economia tardia a exemplo da Ilha de Cuba. Nesse caso, não percebem que o nosso país ampliará sua área de influência nas Américas.
            Mas os EUA percebendo esse avanço do Brasil, de imediato, buscou em novembro passado uma “atualização” no relacionamento com Cuba. Por sua vez, a reinstalação da embaixada dos EUA na ilha, a visita de Obama e o possível fim do embargo econômico, fará com que o Brasil siga no vácuo dos EUA com relação a ampliar sua influência comercial como já mencionado anteriormente.
            Devo lembrar ainda que não é de hoje que o Brasil procura manter boas relações com Cuba. As relações Brasília-Havana foram iniciada com o ex-presidente Jânio Quadros e após o fim da Ditadura Militar no Brasil, foram reatadas em 1985 e têm melhorado desde então. Em 1992, no governo Fernando Collor, houve uma tentativa de trocar votos em eleições para postos em organizações internacionais. A prática, como a Folha de S.Paulo mostrou em 2011, continuou no governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), sob o qual o Brasil também fechou parcerias e intercâmbios com Cuba.
            De fato, em 1998 o então chanceler do governo de Fernando Henrique Crdoso, Luiz Felipe Lampreia, se encontrou com um importante dissidente cubano, Elizardo Sánchez, algo que o governo brasileiro parece muito distante de fazer. Pode-se, e deve-se, criticar o fato de o Planalto sob o PT não condenar publicamente as violações de direitos humanos da ditadura castrista, mas não se pode condenar o investimento no porto de Mariel. Neste caso, prevaleceu o interesse nacional brasileiro e agora quem vai tirar o maior proveito dessa ação estratégica do nosso país é os EUA. Por outro lado, nos restará apenas a críticas dos que sofrem com o complexo de vira lata