quinta-feira, 30 de junho de 2011

Não vamos enterrar um homem, vamos plantá-lo – Parte III
            Continua a viagem, dessa vez o silêncio prevaleceu no nosso taxi que fazia o nosso deslocamento de Porto Velho a Nova Mamoré. O sono se abateu nos passageiros que estavam no banco traseiro, apenas eu e o motorista papeava sem parar sobre a paisagem ao longo da BR. 364. O sol nos castigava, pois o Chevrolet, modelo Ipanema já estava bastante surrado pelo tempo de uso e não tinha o acessório indispensável para os trópicos, ou seja, o ar-condicionado, tão prejudicial na camada atmosférica por conta do CFC, que quando liberado mesmo em menor escala, é preocupante a sua emissão da camada atmosférica.
            Continuei admirando o pasto a o gado na beira da cerca das fazendas as margens da estrada. O gado Nelore é a raça predominante no pasto e pouco aparecia raça holandesa, que é muito boa de leite. Essa, quando aparecia era próximo as casa sedes das propriedades nos currais. As cenas me fizeram reportar aos tempos de minha infância que vivi na Granja Sandy de propriedade dos meus pais, que era localizada no Bairro Costa e Silva, na capital paraibana e que na atualidade virou um loteamento de casas populares.
            A lembrança de infância silenciou-me no carro, viajei no tempo, lembrei de minha babá Nair, que por sete anos de sua vida, dedicou-se a cuidar de mim. Esta quando viaja de férias para Alagoa Grande, sua terra natal, a fim de rever seus familiares e matar a saudade do convívio com os mesmos, a febre aparecia de forma violenta em meu corpo, causando delírio e apavoramento em minha mãe. Muitas vezes, as férias de Nair foram interrompidas pra retornar a minha companhia de tão preocupada que ficava ao saber do meu estado de saúde.
            Os fleches vinha a minha mente cada vez que visualizava o gado, pois desde cedo convivi com a terra, pois acordava cedo com o canto do galo e das galinhas. O café-da-manhã era uma caneca com Nescau que se enchia de leite bem quentinho direto do peito da vaca. Esse costume pela manhã bem cedo tinha uma particularidade especial, o vaqueiro tinha que ser o meu pai ou meu irmão Anisberto, de outra mão que tivesse ordenhando a vaca eu não tomava o leite, voltava para casa e sentava a mesa para saborear o tradicional cuscuz de milho, dependendo do dia, o seu acompanhamento, seria o leite, ovos de galinha de capoeira, o queijo coalho bem assadinho ou queijo de manteiga derretido, um prato típico de toda mesa nas casas das famílias nordestinas.
            O caminho até Nova Mamoré já se encurtava, pois logo o motorista interrompeu meus pensamentos para avisar-me que após a ponte sobre o Rio Mutum-Paraná novamente iria ter outra parada estratégica no Distrito que leva o mesmo nome do rio e que na lanchonete eu poderia degustar uma saltenha, um salgado tipicamente da gastronomia boliviana. Assim, quando avistei o lugar, fiquei encantado com a ponte de ferro da antiga E.F.M.M sobre o Rio Mutum, bem como a caixa d'água que serviu no passado para abastecer os trens a vapor ao longo do percurso de toda a estrada de ferro que fazia o trajeto entre Guajará-Mirim e Porto Velho ou vise versa.
            Quando desci o taxi, fitei meus olhos nas pessoas que estavam na lanchonete, pois o local até hoje ainda serve de parada estratégica para os ônibus de passageiros, tanto regional como interestadual. Naquele momento, nunca passou em minha mente que num futuro bem próximo a cidade desapareceria, se tornando um sítio arqueológico por conta da elevação dos níveis das águas do Rio Madeira e as alagações causadas por conta da formação do lago para mover as turbinas da Usina Hidrelétrica de Jirau, pertencente ao consórcio Energia Sustentável do Brasil.
            Tal evento que fez desaparecer o Distrito de Mutum-Paraná, serviu para surgir à Nova Mutum, uma nova cidade planejada desde as suas ruas largas até as construções arquitetônicas padronizadas destinado nas áreas de equipamentos públicos. As casas que também são padronizadas e suas construções foram para servir de habitação aos trabalhadores do canteiro de obra da construção da Usina de Jirau, bem como abrigar os antigos moradores de Mutum que tiveram que ser indenizados e retirados do antigo lugar que habitavam por muitos anos, ou seja, desde o aparecimento da E.F.M.M.

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